sexta-feira, 30 de setembro de 2011

Pombas

O dia estava muito claro e o céu de um azul completamente sem nuvens, o que costuma despertar na maioria das pessoas uma  vontade de sair para a rua, de passear por aí ao lado de alguém, ou simplesmente andar sozinho. Principalmente se este dia, pra grande felicidade de José Eulálio, coincidir com um feriado, quando portanto não precisava trabalhar.
Saiu também pra rua, ligou e ficou de encontrar uma pessoa, e essa pessoa era como ele, gostava muito de tomar birita, pois logo sugeriu de encontrarem-se num bar.
  - Pô, mas sabe o que é, Alfredo? Eu estou sem capital pra tomar cerveja, por que a gente não aproveita hoje e vai tomar uma vodka lá na praça?
- Tá na mão! Então a gente se encontra lá daqui a uma hora!
- Falou!
Meia hora depois já estava José Eulálio esperando, sentado num banco, tomando direto da boca da garrafa uma meiota ouro, enquanto o amigo não chegava, quando uma garota sentou-se ao seu lado:
-Oi!
-Oi?
-Lembra de mim?
-Sinceramente? Não.
-Paloma, a gente fez junto o primeiro ano, andava eu e a Júlia...
-Claro, claro.
Era a amiga que andava sempre junto da menina que ele era afins, mas estava bem diferente, toda vestida de preto, o cabelo preso numa trança comprida e umas olheiras desenhadas a lápis.
-Estou esperando um amigo, você bebe cachaça? Aceita um cigarro?
-Eu não fumo, mas quero um gole. Estás sozinho?
-Como disse, estou esperando um amigo, o Alfredo, não vais te lembrar mas ele também estudou lá com a gente.
-Eu perguntei se estás sozinho ou se estás ficando com alguém, não quero saber do teu amigo.
Paloma deu uma risada, a mesma risada da época do colégio, mostrando todos os dentes e a gengiva, jogando a cabeça pra trás e terminando com umas fungadas. Era estranho, mas nos últimos tempos ele andava meio que vivendo no passado, e ao escutar aquela mulher ele teve a mesma sensação esquisita de antigamente:
-E a Júlia?
-Teve um filho e casou. Faz um tempão que não falo com aquela vagabunda.
-Como?
-Tu não sabias? Era uma vagabunda mesmo, te roubou de mim!
-O que?
-Me dá mais um gole aí. Tu não achas que agora eu estou muito mais gostosa?
-Hã?
-Sabia que ela me contava toda vez que vocês transavam, só pra eu ficar com inveja?
-Sério?
-Ha ha ha ha ha ha ha hã hã hã hããããããããã....
Deu outra daquelas risadas assustadoras, bem na hora em que Alfredo vinha chegando, com uma garrafa de vodka numa mão e uma carteira de derby na outra, abrindo os braços na maior alegria:
-Aí José Eulálio! Não vais apresentar a gata?
-Paloma esse é o Alfredo, Alfredo, Paloma, lembra dela? Agora cês me dão licença um instantinho que eu vou bem ali na esquina tirar água do joelho.
Deixou os dois conversando, dobrou a esquina e saiu correndo, espantando os pombos que bicavam restos de vômito por ali.

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