domingo, 27 de novembro de 2011

Monte dos Sonhos

        O vento era capaz de derrubar as pessoas, deixando-as prostradas com o corpo dolorido, os ossos gelados e a respiração difícil. Mal insidioso que se não fosse logo tratado levava-as à morte em menos de duas semanas.
        Era estranho naquela terra como o fato ocorria: geralmente pelas sete, oito horas, quando a escuridão já estava completamente instalada, vinha aquele primeiro pé de vento que era considerado o mais perigoso: continha o germe da moleza e da preguiça invencíveis, contaminando mais facilmente quem se  arriscava abrindo as janelas exatamente nesse horário.
        Durava cerca de quinze minutos o miasma travestido de brisa, cujos sintomas vinham sendo notados em parcela cada vez maior da população. É possível que o efeito deletério dessa massa de ar seja acumulativo, então daqui algumas gerações todos nós estaremos prostados no fundo de uma cama, e será a extinção da raça humana.
        Não sabiam ao certo se o vento deixava mesmo as pessoas doentes. Nesse caso havia uma solução, talvez a pior de todas, e estava prestes a ser tomada: Assumiriam todos os riscos que seriam deixados aos netos e bisnetos  no futuro, ao impedir o ar maligno de circular, bastando gastar uma fortuna construindo um muro de um qulômetro de altura e mil de comprimento isolando a região.
        O miasma impregnante continuava a movimentar-se, desta vez na direção de onde concentravam-se os resíduos da energia do pôr-do-sol, a que os cientistas chamavam Poeira Solar Espacial, e como toda e qualquer poeira cósmica esta fazia mal aos pulmões, ainda mais numa terra onde, com ou sem fluidos atmosféricos circulando, corações e mentes viviam encharcados.
         Formalizou-se então uma parceria Privada-Pública, ou seja, o governo jogava dinheiro na privada e os empreiteiros davam descarga, depois do tal muro anti-brisas, que desde o começo era uma verdadeira cagada e nunca ia funcionar como devia, mas tinha sido levado adiante para que alguns privilegiados metessem a mão numa grana preta.
         As mortes continuaram sempre, já que o motivo das pessoas derrubadas sem forças era o mosquito transmissor da malária que alimenta-se precisamente depois do pôr-do-sol, ocasionando ao cidadão uma febre danada e uma moleza de morte pelo corpo.
        A obra gastou o que pôde e o que não pôde. Destruiram a paisagem e alguns sonhos; jogaram tempo e dinheiro fora para no fim das contas erguerem um tapume gigante. Dinheiro que faltou para fazer coisas realmente úteis, como tentar interromper o ciclo de miséria neste país ao invés de incrementá-lo, metendo goela abaixo do povo ignorante uma maracutaia injustificável e fraudulenta na maior cara-de-pau, só para variar.

3 comentários:

  1. Augusto, alguém já lhe disse que você escreve a medida e velocidade do que pensa? Alguns leitores a procura de novidade, como eu, conseguirão perceber que seus escritos ditam com facilidade uma certa faceta de sua personalidade. Fiquei curiosa, certamente lerei mais e lhe direi minha opinião. Se quiser, poderia me dar sua opinião também acerca dos meus escritos, trata-se de um tipo diferente de leitura, mas por certo, um bom escritor como você poderá me fazer críticas úteis, eu apreciaria muito.
    http://sonhosemparagrafos.blogspot.com

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  2. Olá!

    Te dei um selinho e um meme literário, se puder entre para ver: http://laviratta.blogspot.com/2011/12/meme-literario-1.html

    abraços!
    Pri

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  3. Valeu, Pri, respondido!
    Um grande abraço!
    :)

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