O que aconteceu com toda aquela raiva e melancolia e descrença em si e nos outros pela certeza de estar vivendo no pior dos mundos? O que aconteceu?
Caminhavam de mãos dadas na rua e de alguma forma era estranho ver um casal andando tão companheiros um do outro. Queriam se mostrar aos outros passantes ou realmente gostavam-se a ponto de não se importar com a opinião alheia?
Ela estava na praia junto do namorado. Tinham acabado de sair da água, o dia estava espetacular com os raios solares atravessando todo o arco celeste do azul mais impressionante que os tons alcançados pela poluição da cidade. Ali era tão distante de tudo, que apenas há alguns anos a luz elétrica havia chegado e mesmo assim o serviço era bem irregular. Estranho isso não parecer grave incômodo aos nativos, que viviam aparentemente felizes como se houvessem outras coisas mais interessantes a fazer na vida.
O vento sacudia as folhas violentamente. Alguns galhos partidos caíram pelo telhado. Pássaros voaram assustados. Um camaleão moveu-se agarrado ao tronco e foi percebido. As nuvens cinzentas cobriam tudo, sinal de que em breve cairia forte chuva.
Enquanto isso, dois mil anos atrás, do lado oposto do mundo uma criança nascia.
Noutro lugar ali por perto e na mesma época, um chinês chamado Si-Phu inventava a pólvora sem saber para que servia, produzindo e estocando vários quilos do material porque gostava do cheiro que exalava: "Parece merda de vaca!". Até que um dia, trabalhando até o fim da tarde para finalizar a primeira tonelada do produto, sem conseguir enxergar mais nada por causa do sol que se punha, precisou acender uma vela...
No tempo presente, nos fundos de um colégio da periferia, uma criança recém-entrada na puberdade experimenta seu primeiro cachimbo de crack, sem nunca ter fumado tabaco ou maconha, e sem fazer idéia do que foi o Planet Hemp, essa banda sem vergonha.
Um figura resolveu começar a pintar quadros. Comprou telas e tintas, fez vários cursos e pintou algumas paisagens e naturezas-mortas durante o ano para entregá-las como presente aos amigos no natal:
-O que esse debilóide gastou com essas porcarias de pintura poderia ter comprado um tablet pra mim!
-Eu gostei da minha. Parece uma serpente lutando contra uma águia sobre um rochedo no mar revolto...
-Isso é uma maçã e um cacho de uvas, seu imbecil!
Uma senhora já avançada nos setenta entra na igreja, anda a passos miúdos pelo corredor central e escolhe a segunda fileira de bancos mais próxima do altar para sentar. Faz o sinal-da-cruz, ajoelha-se, põe as mãos juntas na frente do rosto e de olhos fechados faz a seguinte oração:
"Senhor Deus, abençoa todas as pessoas deste mundo: as que te conhecem para que façam sempre tua vontade; e as que ainda não conhecem para que venham a saber quem é Jesus Cristo."
Amém.
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