quinta-feira, 6 de outubro de 2011

A Incrível Estória De Seu Benjamim

      Estávamos sentados nos bancos de frente para a praia, debaixo da sombra do castanheiro, com uma garrafa de 51 e um saco de cajus para tira-gosto, numa posição onde podíamos também ver as pessoas que desciam para atravessar o canal em direção à areia, alguém comentando que mais tarde quando a maré baixasse ele levaria todo mundo no mangue, outro dizendo que ia pegar não sei que rabeta. Mas eu acho que todo mundo já estava muito chapado àquela altura: nem bem a garrafa ia pela metade, tinha gente querendo fazer outra coleta:
-Ô Mão-de-Sogra, chega aí e toma uma com a gente!
-Ôpa, é pra já!
-Tens uma intéra pra outra?
-Égua, sabia que vinha facada! Quanto falta?
Quando conheci o Seu Benjamim, perguntei pro Redisco, que na verdade se chama Pedro Carlos, o motivo do apelido Mão-de-Sogra:
-Tu ja viste uma mão de sogra? Pois olha pra ele!
Como ele deu por encerrada a explicação, também não perguntei mais nada. Mas era um cara gente fina, sempre que eu passava por ele ou estava bêbado ou tentando ficar, o que não era difícil, pois de todos ali era pra mim quem mais se virava. Não tinha serviço por mais tosco que fosse que ele recusasse.  Fazia coisas às vezes a troco de nada, só pela amizade:
-Taí pra mais uma! Sabe de onde é esse dinheiro? A mulher do Francisco me encomendou vinte caranguejos!
E vivia sempre pegando caranguejos, subindo em coqueiros, carregando areia ou pedras, tirando toras no mato, capinando, remendando redes, pescando com elas, tirando turú, catando sarnambí, fazendo carvão,  servindo de caseiro e o que mais pintasse.
Uma vez ele apareceu perguntando quem podia ajudar ele num negócio leve, três metros de pedras pruma casa que ele ia construir. Estava ficando sem um puto então me ofereci pro serviço, mas Seu Benjamim me olhou como se não acreditasse muito:
-Já carregaste pedras na vida?
-Bom, eu acho que já, quer dizer, depende da pedra...
-Depende da pedra? Então carrega aquela ali pra eu ver.
-Qual, essa dali do lado de lá do pau?
-Não, a outra de trás, aquela com um matinho.
Disse isso e deu um sorriso: era uma pedra enorme, pontuda e cheia de cracas.
Eu já passara por ela várias vezes quando ia atravessar o canal a pé, como naquela hora de maré seca. Falei que era impossível, aquela pedra devia ser muito pesada, além do que estava presa no lodo, e se ele não queria me dar o serviço pelo menos não ficasse de palhaçada, zoando com a minha cara, pois se nem ele se garantia com aquela uma.
Ele levantou a cabeça com uma certa tristeza no olhar, soltou a respiração, enxugou o copo de cachaça num só longo gole, botou a camisa nos ombros e foi cobrindo os cem metros que o separavam da pedra.
E não só conseguiu carregá-la, como veio trazendo-a nos ombros, ela que pesava em torno de oitenta quilos, cheia de lama e areia e bichos, largando-a depois aos meus pés.

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