sábado, 10 de setembro de 2011

A Caverna e O Segredo da Rosa Branca


            Vivia um feiticeiro muito poderoso no interior de uma caverna, que possuía o segredo dos segredos, mas que nunca havia contado para ninguém do que se tratava. Era um mago muito sábio, que evitava sair da caverna justamente para evitar também a tentação de dar com a língua nos dentes. Nota-se que não era chamado de sábio à toa.
            Só que este mago muito poderoso conhecia muita coisa, menos a fórmula da imortalidade. Com o tempo sentia que aos poucos as forças que tão bem lhe serviram na juventude viravam apenas lembrança. Seu corpo obedecia com cada vez mais dificuldade as ordens do cérebro; sua mão deixava cair coisas leves e tremia; suas pernas mal conseguiam sustentar o peso do corpo mirrado:
            - Sinto que meu fim se aproxima! Devo encontrar um jovem feiticeiro para passar-lhe todos os meus ensinamentos, inclusive O Segredo, que guardo apenas comigo, antes que seja tarde!
            Devido à pressa, o Mago foi obrigado a fazer uma espécie de concurso para escolher quem iria sucedê-lo, e a primeira regra era que o candidato tinha de topar passar o resto de seus dias morando numa caverna. A segunda regra era que no dia do teste devia apresentar a magia mais poderosa que conhecesse, para posterior avaliação.
            No dia escolhido havia dezenas de magos e bruxos aprendizes; alunos de Hogwarts desempregados e expulsos depois do fim da série; vampiros e lobisomens que tentavam especialização em magia, para assim enfrentarem o concorrido mercado de trabalho dos personagens trash, que já estava saturado com todo tipo de publicações do gênero. Além de um ou dois Sacis pitando cachimbo e uma Matinta-Pereira, que foi presa fumando um baseado de maconha e não pôde participar do teste.     
            Várias foram as magias apresentadas, mas eu tenho que admitir que o nível da competição estava fraco. Aqueles velhos fogos de artifício coloridos Made in China e várias explosões toscas; vassouras e tapetes e todo tipo de porcaria voadora; cortinas de fumaça, invisibilidade, força sobre-humana, a capacidade de tomar sangue, etc.
            Nada disso impressionava o velho Mago, que enquanto no começo começara a  tirar pequenos cochilos entre as apresentações, estava agora roncando descaradamente de boca aberta no meio dos truques mais enfadonhos.
            Faltava apenas um semideus e um aprendiz de bruxo, além de outro jovem com capuz que não havia falado com ninguém, portanto ainda não tinham conseguido descobrir de quem se tratava.
            O bruxinho foi primeiro: trazia na mão uma varinha de condão cuja ponta costumava transformar em pirulito de abacaxi, seu sabor predileto, e disse que se chamava Harry Píter.  Justificou-se dizendo que não tivera tempo de treinar muito, pois agora tinha mulher e filho para sustentar, e que por isso estava batalhando aquela colocação, pois atualmente estava vivendo de bicos como personagem secundário em contos bizarros sem pé nem cabeça.
            - Está certo, sem chororô, mostra logo aí o que tu trouxeste pra eu ver!
            Harry Píter não esperou segunda ordem, e preparou o truque que conhecia muito bem. Com um gesto dramático fez com que todos se calassem, e apontou sua varinha mágica para uma senhora inglêsa no meio da platéia, deixando-a paralisada de susto, e murmurou logo em seguida as seguintes palavras:
            - Mui Granafixarum Cumlibros Toscos!!!
            Depois do clarão e da fumaça de praxe, o Mago percebeu que aquele jovem bruxinho era realmente muito bom: a senhora que tinha ido até ali apenas para ver se morria alguém na disputa, agora tinha bilhões de libras em sua conta bancária, o que fez com que prestassem reverência à Harry todos os presentes, exceto o estranho encapuzado.  
            O segundo chamava-se Percí Jéquisson e não se intimidou, pois também era muito bom. Com um gesto dos braços fez com que toda a água dos banheiros químicos usados pela multidão durante o dia espirrasse de volta naquele povo, provocando-lhes novamente enorme reverência, desta vez ao semideus Percí.
            Via-se que o sábio Mago tinha uma dúvida atroz de que dependia o futuro de seu segredo. Como não podia ponderar muito, já que a morte estava muito próxima, resolveu jogar na sorte cara ou coroa, com uma grande moeda de prata que tirou do bolso.
            Mas nesse exato momento, o encapuzado saltou do meio daquela multidão coberta de merda e gritou, jogando o capuz ao chão, revelando as formas maravilhosas de uma morena bronzeada e seminua:
            - Agora chegou a minha vez!
            E começou a rebolar e dançar só de biquíni na frente do velho Mago, e não só ele mas também todos os outros que estavam lá, inclusive o Harry Píter e o Percí Jéquisson, ficaram enfeitiçados. Ela era uma brasileira dançarina de programa de auditório, cujo corpo escultural foi capaz de despertar no sábio Mago uma vontade que ele não imaginava mais existir. Como porém seu médico havia-lhe proibido de tomar viagra, e realmente o remédio mal começou a fazer efeito ele sentiu uma dor no peito, chamou aquela que havia escolhido para suceder-lhe:
            - Venha depressa, aquela pílula azul que eu tomei...
            - Oba! Já está fazendo efeito?
            - Sim, mas parece que é o meu coração que está endurecendo! Venha para o fundo da caverna e chegue o ouvido próximo de meus lábios para que eu possa contar-lhe O segredo...
            - Oh! Não morra sem antes me contar o segredo da vida, do universo e tudo o mais! E não diga que é 23, 72, 21, 666 ou qualquer outro numeral, que eu já sou bem grandinha e não entro mais nessa de piada nonsense.
            - Cale-se, sua parva!  O-o Segredo é... WhiteRose!
            E morreu.

Um comentário:

  1. A mescla de elementos míticos/midiáticos regionais e globalizados, nesse enredo, ficou primorosa. E nem preciso tecer comentários acerca do desfecho...

    Conto muito bom!

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