domingo, 30 de outubro de 2011

A Mulher Mais Linda Do Mundo

"Eu acho que acabou, mas vou cantar pra não cair, fingindo ser alguém que vive assim de bem..."

        Ela parou na frente do portão, desceu do carro e tocou a campainha. Um menino atendeu:
        -É aqui que mora o João Carlos?
        -É sim. Quer que vá chamar?
        -Por favor. E diz que é a... uma amiga dele.
        Entrou e sentou-se numa das poltronas de vime da varanda, puxou uma revista e começou a folheá-la desatenta, pensando no que viera fazer ali depois de tanto tempo.
        A manhã fora mais quente que o normal e a tarde seria de chuva, prenunciada pelas nuvens carregadas que vinham em direção à cidade.
        O vento cessara subitamente e isso só podia significar uma coisa. A sensação de abafamento era forte, o menino que atendeu a porta veio oferecer água:
        -Muito obrigada.
        -Foi a mamãe que me mandou trazer.
        -Quantos anos você tem?
        Ele fez um gesto com as duas mãos.
        -Oito, nove?
         Ele fez que sim com a cabeça, parecia um pouco tímido mas não arredava pé dali, estava esperando que ela terminasse de beber para levar o copo ou fazendo sala porque a mãe havia mandado:
        -O que o João é pra ti?
        -Meu pai.
        Ela endireitou-se na cadeira, franziu o cenho como se não acreditasse, atirou a revista sobre a mesa e ficou examinando aquele garoto que em nada se parecia com o homem a quem tanto amou, cujo rosto ela invariavelmente lembrava nos momentos de solidão, com o peito carregado de saudades.
        Mas o que imaginara então? O impulso de ir vê-lo sem mais nem menos, sem ter como avisar, o que esperava acontecer naquele encontro não sabia, apenas uma coisa estranha no peito, como a expectativa de que algo mágico ressurgisse.
        Não percebeu quando outra mulher um pouco mais jovem apareceu, vinda de dentro da casa. Usava um vestido azul um pouco curto, de algodão, tinha um corpo bonito e recendendia a alfazema, como se tivesse acabado de se perfumar:
        -Oi, tudo bem! Você que é a amiga dele? Infelizmente o Joca saiu, mas como eu sou a mulher dele você pode deixar o recado comigo que eu passo depois.
        -Não, não precisa! Olha, desculpa incomodar nesse calor, eu sou só uma conhecida do tempo da faculdade, não sabia que ele tinha casado. Quer dizer, não precisa dizer que eu vim não, desculpa mesmo incomodar...
        Ela levantou para ir embora despedindo-se apressada, mas antes que pudesse cruzar de volta o portão, a moça em pé na varanda ainda teve tempo de perguntar:
        -Então você que é a Juliana?
        -Prometo que não incomodo mais...
        E quase correu em direção ao carro, depois desaparecendo no fim da rua, enquanto caíam grossos os primeiros pingos de chuva no asfalto quente.

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