quarta-feira, 5 de outubro de 2011

Volta Pro Mundo

     
        -É preciso não olhar pra trás...
Vinha descendo a rua na direção da escadinha, eram duas da tarde e as poucas pessoas que caminhavam, procurando qualquer sombra possível, tinham testas franzidas, ao invés de abrirem bem os olhos para aproveitar o espetáculo que é estar aqui e vivo:
-De alguma forma, o futuro virá e  tudo será diferente...
Não sabia que futuro seria esse, e de novo queria achar que as coisas passariam a ser diferentes, mas sempre acabava reepetindo as mesmas merdas de sempre, com as mesmas pessoas de sempre, restringindo a si e aos outros, envenenando-se e tornando-se mau, piorando a cada dia em que insistia que podia enganar-se para sempre.
Continuou andando, distraído, enquanto ao seu lado passava um rapaz apressado, aparentando ter a mesma idade, que talvez por ser feriado caminhava também distraído, também com a cabeça baixa por causa do sol, mas que na hora de atravessar em direção à calçada do Banco Central, não viu o carro que subia a toda velocidade, e acertou-lhe de uma forma tão violenta que foi possível ouvir o som dos ossos se quebrando.
O motorista desceu e parecia meio embriagado, ou simplesmente atordoado pela porrada, sentou no meio fio e começou a chorar com as mãos no rosto: o rapaz estava obviamente morto e não havia mais nada que se pudesse fazer.
Por curiosidade, pelo choque daquele corpo ali estendido, alguém que um minuto atrás passara-lhe ao lado, cheio dessa energia que anima nossas vontades, mas que não pode controlar o mundo, foi-se aproximando, e assustou-se com a semelhança entre ele e o cadáver.
Sem que percebesse, um garoto de aproximadamente dez anos de idade parou ao lado, também ficou olhando a cena, e começou a falar um monte dessas besteiras de criança, mas depois se virou e encarou sério e perguntou:
-É teu parente?
-Não, não conheço, ele só passou pelo meu lado...
-Mas viu como ele se parece com o senhor? O que o senhor faz da vida?
E em menos de um minuto, sem saber o motivo, viu-se ali resumindo toda sua vida, o que fazia, seus problemas e mais o que achou importante para um garoto que provavelmente não faria a mínima idéia do que ele estava falando. Foi então que algo incrível aconteceu:
-Tio, deixa eu te dizer uma coisa. Se isso que acabaste de falar é verdade, saiba que esse homem estendido aí na frente era exatamente da tua idade, não tinha nem a metade do que tu tens, mas tava feliz da vida, porquê tinha  acabado de ser contratado prum emprego melhor e ia contar isso agora pra namorada, ali na escadinha de frente pro rio. Além do que ele também é meu irmão...

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