segunda-feira, 3 de outubro de 2011

Como É Bom Morrer No Mar

        Deitados na cama, suados, nus, ela olhava pela janela a árvore imensa, o céu azul mudando de cores por causa do finzinho da tarde. Deviam ser umas cinco, seis horas, e eu ali sem conseguir pensar em nada, nem ao menos juntar duas palavras para descrever o que estava sentindo.
Ela virou-se com um sorriso, mostrou a língua, eu lhe dei um beijo e novamente veio aquela coisa a que eu ainda não tinha dado nome, e lamentei por não ter nascido poeta.
Joana segurou meu rosto com as duas mãos, me olhou por alguns segundos, sentou-se sobre as pernas cruzadas e me perguntou, meio brincando, meio sério:
-O que foi?
-Nada, por que?
-Olhastes de um jeito tão estranho, parece que eu pude ver através dos teus olhos.
-E o que foi que você viu?
-Não sei, esse brilho estranho, eu diria que por um momento vi tua alma...
Novamente a sensação inominada me invadia, como se houvesse disparado um gatilho e agora não fosse possível voltar atrás. Ainda assim não podia explicar, se pudesse teria o maior prazer em contar àquela mulher tanta coisa que se agitava na minha cabeça, qualquer coisa como uma lembrança boa, distante, imaterial, embora ela estivesse ali na minha frente, ao alcance da minha mão que estiquei para tocá-la, encostando a ponta dos dedos em seu seio, descendo até os pelos do púbis, uma agonia, uma alegria, uma tristeza:
-E se eu dissesse que não sei o que é amor?
-Mas a gente não se ama, por quê me dirias isso?
-E se eu dissesse que não tenho nenhuma resposta, e como você só pergunto das coisas sem nada esperar, e que sempre soube viver com isso, mas agora parece que finalmente fiz a pergunta certa, e como consequência acabei perdendo a única certeza que tinha, e que isto me causa um enorme desconforto e agonia, como se só isso importasse?
-E alguma vez já tinhas sentido isso antes?
-Não sei. Parece que sim, quer dizer, há muito tempo que não, mas foi numa época em que eu não tinha medo de nada e achava que só eu importava no mundo, mas agora é como se eu tivesse caído no meio do oceano e tivesse desaprendido a nadar...
Calamos. Ela tentava enxergar dentro dos meus olhos o que nem eu conseguira entender, descruzou as pernas e deitou novamente ao meu lado, desta vez passando suavemente a mão pelo meu corpo, como se quisesse me consolar. Então subitamente estremeceu, apoiou o cotovelo no travesseiro e me encarou: naquele momento descobria a sorte de ser poeta, pois a única pergunta que me fez era a resposta para todas as outras perguntas, e continha no fundo aquilo que foi, é e sempre será; o que os homens vêm sentindo desde o começo dos tempos, e que a cada dia morre um pouco com cada um:
-Agora acreditas?

Um comentário:

  1. Bacana, esse jeito que escreves levando o leitor a se envolver com a trama... pelo menos comigo, é assim. Um grande abraço!

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