segunda-feira, 5 de dezembro de 2011

Nativada Agradece

        Um mês. Pode não parecer muita coisa, mas foi o tempo que eles passaram na ilha, sendo que o planejado era ficar só pro fim de semana. Mas sabe como é, quando a gente está se divertindo, o tempo é o que menos importa.
        -E vocês viviam de quê?
        -A gente aprendeu a pescar, fazer farinha, tirar caranguejo e turu, carregar areia ou pedras, capinar, caiar uma cerca ou uma parede, saíamos para catar frutas da época; o que pintava a gente fazia.
        -E pra beber, como era?
        -Geralmente a gente usava um copo, mas às vezes era na boca da garrafa mesmo...
        O legal é quando se quer ficar sozinho, então você não precisa se preocupar muito com aparência ou essas coisas, embora escovar os dentes e um banho de chuveiro por dia ajudem:
        -Mas que pitiú de peixe, falta alguém se lavar!
        -Não olha pra mim, acabei de vir da maré!
        -Sei, e te esfregaste com areia, seu porco...
        E teve o dia em que fez uma puta lua cheia, que ninguém nunca tinha visto daquela cor e daquele tamanho na vida:
        -Putz, acho que tá maior que o sol!
        -E mais clara também!
        -Só que vermelha! Onde já se viu uma lua vermelha?
        -Pra mim é laranja.
-Eu acho que é amarelo-escuro!
        -Alguém mais aí tá vendo violeta?
        Mas teve o dia em que finalmente secamos todo o estoque de álcool do lugar, então era hora mesmo de ir embora. Mas faltava a saideira:
        -Aí, galera! Saca só o que eu achei perto de onde estavam aqueles bois ontem no campo!
        -Rapaz, quantos cogumelos!
        -E do bom!
        -Põe logo no fogo uns dois litros d'água!
        E saímos mais ou menos fugidos, pois o dono da casa, vendo que a gente ia de vez mesmo, resolveu fazer uma bacanagem:
        -Trouxe uns pães pra tomar com chá antes de vocês irem embora, pessoal!
        -Mas Seu Formigosa! Acho que esse chá não vai sobrar pro senhor, não!
        -Como não! Mas tem tanto aí! Deixem de mesquinhagem que o que tem aqui é pouco mas a gente divide com todo mundo!
         E foi assim que o Seu Formigosa, depois de tomar umas três xícaras enormes até a borda de chá de cogumelo da bosta do boi zebu, viscoso de tão forte, que o resto do pessoal tinha tomado só um golinho com medo, conseguiu passar três dias acordado, carregando pedregulhos do canal até a porta de sua casa, onde mais um pouco e  acabaria construindo um novo trapiche para a comunidade, se a liga do chá finalmente não tivesse acabado.   

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