domingo, 18 de dezembro de 2011

Uma Estrela Aquece o Dia

   
        Era sem dúvida o dia mais frio do ano. As pessoas habituadas a sair nuas para a rua, à moda dos índios, tiveram que vestir uma roupa dessa vez, ou não aguentariam o pinga-pinga daquela água gelada na cabeça o dia inteiro.
        Depois de umas cinco horas ininterruptas a chuva afinou um pouco virando um chuvisco, que junto com o vento atlântico era o tipo de clima que levava alguém a ficar resfriado.
        Escutou o barulho do cadeado batendo no ferro do portão, o que causou-lhe surpresa, pois não estava esperando ninguém ainda mais num tempo daqueles.
        -Ô de casa, abre aqui!
        -Caramba!
        Uma amiga dos tempos de faculdade com quem tinha perdido contato há anos, de alguma forma tinha conseguido seu endereço e esperava ali debaixo de uma sombrinha. Foi buscar as chaves e abriu a porta:
        -Estela, há quanto tempo! Você não mudou nada!
        Muito pelo contrário. Embora estivesse com os cabelos bagunçados e com a roupa molhada, ou por isso mesmo, parecia muito mais bonita do que era capaz de se lembrar. Sua voz fresca como o marulhar de uma fonte acariciou-lhe os ouvidos como já não imaginava que fosse possível, com aquele timbre um pouco grave e morno, o sorriso e os olhos brilhantes, fazendo-o sentir novamente uma dor gostosa no peito, e uma tontura, e uma espectativa de felicidade:
        -Senta aí que eu vou buscar uma toalha...
        -Traz um café também? Quer um?
        -Não, obrigado, parei com o cigarro. Mas tem um cinzeiro nessa mesa, fica à vontade que eu já volto.
        -Tá bom!
        Cara, como é essa vida. Uma pessoa de quem você não fazia mais idéia por onde andava aparece na sua casa no meio da tarde, depois de uma chuva de horas que caiu a manhã toda, justo quando você pensava que aquele seria mais um dia nublado, solitário e triste, essa pessoa maravilhosa bate no portão trazendo a amizade e o calor de seu corpo, numa grata surpresa.
        Quando subiu de volta para o quarto levando a toalha no ombro e duas xícaras de café quente, Estela estava deitada na cama enrolada no lençol, apenas a cabeça de fora, fumando tranquilamente seu cigarro, como se aquele lugar à ela pertencesse há muito tempo, embora ela nunca houvesse posto os pés ali antes:
        -Toma aqui. Nossa, não sei nem o que dizer! Como você me encontrou?
        -E isso importa? Deixei minhas roupas nessa cadeira aí do teu lado, estende pra mim para ver se secam um pouco enquanto eu termino esse cigarro, depois vem aqui deitar comigo...

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