sexta-feira, 9 de dezembro de 2011

Cães e Rodas

        Ao ver a distância que existia entre a pessoa que era e a pessoa que gostaria de ser, abatia-lhe realmente uma profunda tristeza. O que faltava para colocar em prática o eterno projeto de tornar-se alguém melhor? Começaria cortando os vícios, anotando numa caderneta as coisas essenciais de ter-se por perto e que usadas com critério estimulariam a alegria e o bem-estar:
        1-Comida
        2-Bebida
        3-Fumo
        4-Papel e lápis
        5-Alguém.
        Tinha certas vontades, mas talvez não ligasse muito em vê-las satisfeitas e por isso mesmo se desse por satisfeito, fazendo ainda questão de agradecer. Mas no fundo queria que existisse outro jeito de levar a vida.
        Um jeito que resumia-se a um desejo seu satisfeito, de provocar as pessoas, ao invés de sentir-se levado como elas na correnteza irresistível do mundo que tentava transformar, embora não fosse possível modificá-lo mais do que até no exato limite de si mesmo.
        Depois escreveu uma lista das coisas que tinha aprendido recentemente e que estavam mais frescas em sua cabeça por isso, ou talvez por figurarem sem que ele soubesse no plano original de ser uma pessoa o menos politicamente correta possível:
        -As verdades não são eternas, exceto uma; que a vida é feita de paradoxos; e que quando você passa uma semana sem fumar as coisas voltam a ter cheiro e gosto novamente; que existe uma outra dimensão em nossa cabeça, a que infelizmente apenas nós temos acesso; que a dor da perda causa muito sofrimento e deve ser respeitada; a nossa consciência é nosso guia, então cuidado com o que você pensa; que é permitido chegar nos lugares mais incríveis a quem tiver coragem; que sentimos as coisas muito mais do que pensamos; que devemos ter valores e exercitá-los assim como exercitamos a mente e o corpo; que é muito difícil ao reler isto saber se daqui a alguns anos ainda será possível entender o que significa.
        E que nossas tardes ensolaradas serão sempre lindas. Que a tristeza e a ausência são duas coisas distintas, mas que se tornam uma quando você vai embora; e que toda linguagem é insuficiente, por isso existe a poesia.

Um comentário:

  1. Desde que o homem escolheu o seu proprio caminho, sua vida se redunda sempre em desgraça. Por melhor que sejam as intençoes, no fim sempre surgirá uma mazela qualquer. O que falta, a ele? A nós, na verdade? "voltar" ao inicio. Ao começo de tudo (Deus!) e deixar lá; diante dele o velho e pegar o novo.Assim, todo projeto terá começo, meio e fim. E as tardes ensolaradas durarão pela eternidade afora...

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