segunda-feira, 23 de janeiro de 2012

Jorge Finca-Poste

       

        Chamavam ele de finca-poste e não era pra menos: trabalhava na Companhia de Energia e passava a maior parte do dia em cima dos postes da cidade, às vezes caindo deles:
        -Mas me conta agora, ainda andas tomando uns gorós?
        -Ora, se não! quer um gole dessa birita aqui?
        E tirava de dentro da bolsa uma garrafinha de plástico com tampa de enroscar que oferecia, e nem ele sabia o que tinha dentro, mas era tão forte que fazia mal.
        Jorge não fazia as coisas por sacanagem, eu o conhecia já fazia tempos e no fundo achava que era um cara justo, mas sei lá, às vezes as más companhias ou a perda de controle sobre um vício, a carga de trabalho, a mulher que aporrinhava por causa dos filhos, o fato de escutar todo santo dia as pessoas chorando miséria, tinham meio que azedado o temperamento de quem outrora me parecera bem mais camarada, mais bem disposto para uma vida que se descortinava tão bela.
        -Mas essa vida inteira é uma merda, tendo que toda hora tomar choques! Para não me incomodar com a dor durante o serviço, bebo dessa porcaria que nem sei o que vem dentro, o resultado: me estabaco de cima da pòrra de escada quando já estou muito porre!
        -Putz! Devias procurar outro emprego, estudar e fazer concurso, enfim, mudar de ramo já que não estás satisfeito.
        -E  você acha mesmo que ser funcionário público ou qualquer outra merda faria meu dia melhor?
        -Bem, talvez parando de tomar tanta birita e procurando se alimentar de vez em quando...
-Ora, seu desg...
        Mas não chegou a completar a frase, pois uma descarga elétrica nesse momento derrubou-o da escada, jogando-o desacordado no chão, com um sorriso cansado nos lábios retorcidos.

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